Preta, e o leite que não alimenta?
- grupomaespretas
- 20 de jul. de 2020
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Eu e a @jessicalauermann conversávamos sobre nossas experiências com amamentação e do nada me veio uma imagem que eu tinha deletado da minha cabeça. Acontece com vocês? Ter um cantinho dentro da cabeça de memórias que são muito doloridas ou que te envergonham muito? Na hora eu me vi no chuveiro de casa, estava sentindo muita dor do peito duro e resolvi apertar e saiu um jato de leite. Um leite branco, forte. Entrei em surto. Liguei pra minha mãe e pro meu marido. Vieram os dois.
Há cerca de uma semana em uma consulta de rotina da 18 semana de gestação nosso bebê não tinha mais batimentos e depois de quase vinte horas nasceu naturalmente em uma cama de hospital. Meu corpo, lá do chuveiro funcionava dentro da sua perfeição, havia tido um parto, ele estava produzindo o leite. Mas minha cabeça sabia ser um leite que não alimentaria ninguém.
Aquele leite alimentou sonhos e expectativas que não existiriam mais para aquela criança. Fiquei mais de dez meses com o tal do leite ali. De vez em quando eu ia lá conferir e aparecia uma gota insistente de uma maternidade interrompida. Eu apaguei o desespero daquele dia do banheiro, mas na gestação seguinte nasceu um medo muito grande do processo de amamentar.
De fato amamentar é tarefa árdua. Mas na conversa com a Jessica compreendi como as coisas estavam conectadas. O medo de amamentar com a impossibilidade de fazê-lo. Somos a construção das nossas experiências anteriores, inclusive as que escondemos de nós mesmos.