Cara amiga branka

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Esses tempos, numa publicação aqui no IG que falava sobre a beleza de crianças negras, uma amiga da época escolar escreveu num comentário: “Sempre te achei uma negra linda.”

Corta para o cenário dos últimos anos do Ensino Fundamental:

• Eu, menina negra, gorda, pobre.

• Ela, menina branca, loira, olhos verdes, "bem de vida".

Não é difícil imaginar o roteiro.

Não tenho nenhuma lembrança de ter sido diminuída ou de ter passado por situações de racismo com essa amiga, mas ser a amiga negra de uma menina branca, principalmente na adolescência, traz por si só uma série de microagressões.

Recordo de no mínimo três meninos negros, altamente cobiçados na escola, inclusive por mim, para os quais eu era invisível, e ela, o objeto de desejo.

Ao melhor estilo bom gosto, sabe?! "Eu moro no morro e ela na zona sul, sou negão e a patricinha é loira do olho verde."

Olhando pra trás, vejo que eu era uma simples figurante na história da adolescência dela. Eu vivia os flertes, as paixões, as descobertas afetivo sexuais, tudo através dela, das vivências dela com os meninos negros que nunca me viram como uma 'negra linda', como ela disse que sempre achou.

Bom, eu tinha o meu bonde, primas e amigas negras, com as quais, do meu jeitinho, lidando com a timidez e algumas fragilidades, até consegui ser a protagonista. Mas a segurança e o pertencimento que eu experienciei no seio familiar não eram suficientes para atenuar a vulnerabilidade e o apagamento ao qual eu era submetida na escola.

Quisera eu esta escrita fosse somente um relato pessoal e isolado da adolescência de uma menina negra nascida nos 80's. Não é. Esse é o tipo de relato que a maioria das mulheres negras da minha geração leem e vão balançando a cabeça, em concordância, recordando e revivendo suas próprias histórias.

Então, cara amiga branka, obrigada pelo elogio, confio que foi genuíno, mas a minha autoestima, no que diz respeito ao ambiente escolar, foi construída à sombra da sua.